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quinta-feira, 2 de abril de 2015

BRASIL / CUIABÁ: PINTURA CABOCLA

Humberto Espíndola - Bovinocultura
A rara oportunidade de confrontar-se com uma arte, ao mesmo tempo engajada e espontânea, aberta democraticamente às raízes e à criatividade popular, carregada de autenticidade e plena de reflexões sobre a realidade atual brasileira, é levada, agora, ao público através da exposição "Brasil / Cuiabá - Pintura Cabocla". Organizada pelo Museu de Arte e de Cultura Popular da Universidade Federal de Mato Grosso, a mostra estreou no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e apresentou-se no Museu de Arte Moderna de São Paulo (Parque do Ibirapuera), até 28 de Junho, devendo depois circular por diversos pólos culturais, como Núcleo de Arte Contemporânea da Universidade Federal da Paraíba, em João Pessoa e no Centro de Estudos Brasileiros, em Assunção, no Paraguai, entre outros. 

Longe das diluições e afetações da arte, que costumeiramente se vê nos grandes centros, as 126 pinturas, dos oito mais significativos artistas mato-grossenses, surpreendem pela total liberdade e grande sensibilidade com que abordam a riqueza do telurismo e a complexidade da problemática de um dos mais fascinantes Estados brasileiros: o Mato Grosso, mostrado inteiro através de um impressionante conjunto de fortes cromatismos e perfeita coerência nos discursos e narrativas. 

Critica Favorável 
"Brasil / Cuiabá: Pintura Cabocla" vem obtendo grande sucesso de público e de crítica, que Já classificou como obrigatória essa mostra coordenada por Aline Figueiredo, crítica de arte Mato-grossense, responsável pela criação e animação do reconhecido movimento artístico existente em Mato Grosso, há mais de quinze anos, e autora de ‘Artes Plásticas no Centro-Oeste’, Edição U.F. MT,1979). Essa obra mereceu o prêmio ‘Gonzaga Duque’, oferecido pela Associação Brasileira de Críticos de Arte, com o patrocínio da Funarte.ao melhor livro de arte lançado no país, em 1.980. 

No catálogo constam análises dos críticos Frederico Morais e Aracy Amaral, importantes estudiosos da arte contemporânea brasileira e latino-americana, além de uma apresentação de Aline Figueiredo, que diz: "Chamada a coordenar esta exposição, acolhemos os artistas Humberto Espíndola, João Sebastião Costa, Dalva Maria de Barros — que oferecem visão erudita e abordagem mais amplas, sendo os artistas mais maduros e pertencentes à uma primeira geração da arte mato-grossense, surgida na segunda metade dos anos setenta - e ainda cinco jovens e vigorosos valores: Adir Sodré, Gervane de Paula, Benedito Nunes, Alcides Pereira dos Santos e Nilson Pimenta, cujas pinturas surgiram e estão se afirmando, nestes últimos quatro anos, através do programa desenvolvido por Espíndola, diretor do MACP (Museu de Arte e Cultura Popular da U.F.M.T.). Sentimos tratar-se de uma excelente oportunidade para levar à metrópole, o melhor exemplo da nossa arte, ao mesmo tempo em que sensibiliza-. nos saber que com esta coletiva o MAM carioca e o MAM paulista abrem suas portas para as iniciativas regionais. O oeste brasileiro é um fato e acreditamos que a pintura apresentada mostre, de maneira pura, e positivamente, a expressão plástica de Mato Grosso, jovem e imbuída do sentir caboclo e cotidiano deste grande espaço que é o interior brasileiro". 

Arte Nacional Brasileira 
Arte bruta, telúrica, vermelha-verde-amarela, céus e chãos da terra, a grande arte nacional brasileira, essa gente incrível, gênios / ingênuos, o pessoal de Mato-Grosso no MAM de São Paulo: país Brasil, terra Oeste, rumo sertão, caboclo, o arquetípico nacional sagrado e consagrado, popular e espontâneo, livre e belo, suor e amor, dor e flor-Arte.

Arte carregada, arte central, arte não poluída, arte não importada, arte sem abstração, arte de bichos e paisagens, mansos remansos, social, urbana campestre, interiorana, captora da realidade atual pátria, marcada e vivida, espontânea, junguiana como intérprete do sentimento-tema do Brasil.



HUMBERTO ESPÍNDOLA é o vanguardista latino-americano do grupo, a bovinocultura do Pantanal, irônico e político, polemico, artista contemporâneo como João Câmara; Adir é o ingênuo tarsiliniano, inacreditável, aos 18 anos, beirando a maestria em tema e técnica, apurada sensibilidade; Dalva, mais pintora, maior que primitiva, cotidiana, simples, pura, a arte integrada ao meio, cenarizada, das barrancas do Rio Cuiabá, aos casarões e às cenas mato-grossenses, organizadas, sentindo sua alma lírica; João Sebastião é telúrico, inquieto, mágico, caleidoscópio, vertente e caudaloso, colorido feérico, vai longe, se não se perder na doce e louca inquietação criadora, sua marca registrada; Benedito Nunes, poético, novo, bruto, arte parida e sentida, sol e lua, risada animada, valor que surge no Oeste-Centro, levado e incentivado por essa Aline Figueiredo, alma boa e rebelde, poeta e líder, incentivadora e autora, amorosa e descobridora, em sua casa-museu em Cuiabá, escorre o sangue e o talento de arte Centro-Oeste, impulsionada por ela, pêlos Brasis limítrofes, respeitos à sua doação energética e criadora; Nilson Pimenta, primitivo em técnica e temática, a pureza ingênua estreante, do baiano integrado no Mato-Grosso, já despertando a crítica paulista e carioca; Alcides, cerebral, ecológico, um artista do nosso tempo, povoado de visões e aparições, indagativo e inquieto, az de ouro do naipe nativo e caboclo, exposto no MAM; Gervane, "o que será, que será" do Chico, intimista, auto-reflexivo, altamente expressivo, ratos e gatos, o ser e a corrosão, antropofágico dentro de si próprio, é a arte mato-grossense centro-geodésico, arte pra rir e chorar, emociona e mexe, com sua identidade real. 

A arte nacional brasileira, repito, central e global de latitudes e longitudes, chapadas e baixadas, locais e gerais, horizontal e vertical, Brasil belo, vermelho-verde-amarelo, Cuiabá, parte, Marte, Arte.  
Eis a arte espaço-tempo, campo cidade, cuiabana e pantaneira, beirando a Amazônia, latina americana, provincial e armorial como quer Suassuna, arte da selva e da civilização do couro e do boi, arte de dimensões continentais, como já detectou anteriormente Frederico Moraes, arte que se renova em temática e linguagem, arte da cultura cabocla, esses autodidatas que documentam Mato Grosso e o dia-a-db cotidiano, críticos e repórteres, subjetivos grandiloquentes, descentralizados, interiorizadores da melhor arte brasileira atual. Um movimento de vinte e dois, hoje-agora. E, em Cuiabá, centro geodésico da América Latina. Essa parafernália doce e criativa, sensual e vibrante, caudalosa e arquetípica, ninguém pode perder. Vale mais que muitos museus, do eixo superado e europeizado São Paulo / Rio de Janeiro. Da selva tropical e do Pantanal do Centro-Oeste nasce a onça que vai abocanhar a arte nacional.

Luiz Ernesto Kawall