sexta-feira, 26 de junho de 2015

GERDA BRENTANI - desenhista e ilustradora


Gerda Brentani está expondo os bichos desenhados de seu Bestiário Brasileiro na Galeria Bonfiglioli. É a nova individual da artista nascida em Trieste e que se encontra no Brasil – onde foi aluna de Rossi Osir e Ernesto de Fiore – desde 1939. Gerda já ilustrou muitos livros e é uma humorista nata, tanto em seus desenhos como em seu dia-a-dia. Ela também é presidente do Clube dos Amigos da Arte – o Clubinho – que congrega mais de mil associados sendo a maioria de artista da capital paulista. Na atual exposição Gerda mostra 42 desenhos utilizando os recursos oferecidos pelo nanquim e guache coloridos. 

Como é a sua característica, o humor está presente em todos os seus desenhos. Somando a liberdade de criação a uma imaginação sem limites, ela recria os bichos que costuma observar atentamente no Museu de Zoologia, onde é uma assídua frequentadora. Nesses trabalhos, jacarés, peixes, ornitorrincos, formigas e outros animais – alguns inventados, como é o caso da centopeia voadora, ou o bagre azul – tomam formas inusitadas, elaboradas num clima surreal que, segundo a artista, é uma consequência de humor: “a caricatura, disse, parte naturalmente para um surrealismo porque distorce uma realidade, embora isso não signifique que eu faça parte da escola surrealista”. 

Realmente, o traço humorístico sempre caracterizou a sua obra. Primeiro em branco e preto, até assimilar as cores que utiliza atualmente. 

A sua sistemática de trabalho sempre obedeceu ao princípio de que, segundo as suas próprias palavras, “para fazer uma deformação válida a figura precisa ser estudada academicamente”. Isso explica as suas constantes visitas ao Museu de Zoologia, onde estuda todos os detalhes dos animais e faz anotações em seu caderno. 

Somente depois de ultrapassada essa fase de trabalho é que Gerda Brentani começa a desenhar, sem nenhuma idéia preconcebida: “Eu simplesmente começo a desenhar. Aí é que descubro a temática que vai predominar no trabalho. Tudo acontece sem querer”. Desta maneira, nesta exposição, a artista não permitiu a presença humana em nenhum desenho. Os bichos aparecem brincando com máquinas e objetos abandonados pelo homem. 

Na minha forma de ver as coisas, o homem, preparando os meios para a sua autodestruição, tem a sua existência seriamente ameaçada, devendo no futuro permanecer apenas os animais. Mas meus desenhos não têm nenhum sentido crítico ou social. Trata-se apenas da maneira como eu sinto as coisas, como elas estão acontecendo, é uma maneira muito pessoal. 

“Minhas criações são muito pessoais, surgem não sei de onde - diz a Artes Visuais. Meu senso de humor, não sei por que, escapa até quando não quero. É inato. E também, com humor, falo sério. 

Gerda acha que o seu gosto de desenhar bichos é de família. A avó austríaca lidava com bichos. E a mãe, que freqüentou a corte de Francisco José desenhava muito bem. Gerda em 1940 conheceu Paulo Rossi Ozir e Ernesto de Fiori, que a incentivaram a se dedicar ao desenho. De Fiore deu-lhe aulas de desenho e Rossi convidou-a a colaborar em seu ateliê de cerâmica (fazia pequenas mesas, painéis, aparelhos de jantar). 

Tenho muitas saudades desses amigos, e de tantos outros, que também muito me incentivaram e acreditaram em mim, como Sergio Milliet, Tarsila, Bonadei, Arnaldo pedroso Horta, Mario Zanini... A Capitu, Carmen de Almeida, quando diretora do Suplemento Feminino do “Estado”, me convidou para escrever e ilustrar contos infantis. Essa colaboração durou muitos anos e depois a Editora Giroflê publicou minha coletânea de contos, o “Psiu”. Temas livres e caçoadas, e a crítica foi muito favorável.

 Conta Gerda que, nessa fase, seu desenho era apenas em branco e preto e marcadamente caricatural. Obras dessa fase foram publicadas num livro, “Atrás da fachada”, Editora Habitat, prefácio de Sergio Milliet. “Buscando novas soluções fui aperfeiçoando minha técnica e tentei também a pintura á óleo. Este, porém não era meu melhor meio de expressão e dessa fase, felizmente, restaram poucos trabalhos. Não gostei mesmo, joguei quase tudo fora”. 

Voltei então ao desenho satírico, colaborei nos 12 primeiros números da “Realidade”. Pouco a pouco, então, sem perder o traço humorístico, as cores voltaram aos meus desenhos e até hoje são parte integrante de meu trabalho. Fiz a série da Mitologia, fiz O Homem e seus objetos, Os Profetas Bíblicos, o Bestiário brasileiro... Charges, não, nunca fiz. Faço os meus desenhos, que são muito trabalhosos, e olhe lá. Caricaturas, sim, mas só de gente que não gostava... Saiam malignos, terríveis - diz Gerda, com o sorriso habitual, o ar bom e inteligente, os vivos olhos, perspicazes atrás dos óculos de segundo grau. 

Diz que, há muitos anos, sem abandonar o desenho como sistemática de trabalho, com a orientação a ajuda de Marcelo Grassman, fez gravura em metal, em todas suas modalidades. São 40 chapas representando o Bestiário Brasileiro, sua sátira em bicharada a coisas e fatos deste país e dos seus habitantes. A Editora Cesar já publicou o primeiro volume, contendo 10 gravuras com prefácio do Prof. Paulo Vanzolini, um de seus grande amigos. “Gosto de ir ao Museu de Zoologia e ver o Vanzolini, e seus incríveis bichos, que traz de todos os lugares do Brasil. A zoologia é mesmo minha paixão”, diz Gerda, com sua voz grave tão característica.

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