Mas saiu dos Campos Elíseos para ver... futebol - É corintiano e gosta de pastel frito - opinião sobre São Paulo: cidade impessoal, avassaladora, egoísta, difícil e tentacular - Acha a presidência um “fardo” mas concorrerá ao Catete.
No dia do aniversário da cidade, que faz o governador? Festeja o aniversário. Mas não da cidade. O Sr. Jânio Quadros faz hoje 40 anos bem vividos.
Poderia festejar o aniversário (duplo) entre pompas. Com o Palácio engalanado. E a turma da Força Pública de fardinha domingueira. Mas Jânio é Jânio. Tem medo dos “inoportunos”. Detesta a intromissão do prefeito Lino em tudo o que faz. Vai, por isso, para o estádio do Corinthians.
Junto do povo ele esgazeia os olhos, baixa a cabeça, deixa que os cabelos fiquem desgrenhados. Ouve calado e aperta as mãos. Raramente olha nos olhos dos outros. Abraça (parece comovido) antigos correligionários. Pergunta muito:
- “Como vai lá o pessoal de casa?”
A voz sai rouquenha e ele dita a frase marcando as vírgulas com a concha da mão. Difícil tirá-lo de junto do povo. Sua mulher, dona Eloá, é quem mais sabe disso. Por isso faz sempre almoço que posa ser comido frio. Pastéis, por exemplo. E ele gosta muito.
É corintiano, como Porfírio é são-paulino. Mas não é fanático. Porfírio já chegou a jogar de goleiro num treino do São Paulo. Jânio, não.
Vendo Corinthians x Palmeiras, torce pelo seu time. Mas elogia um “coice” de Jair (um “goal” adversário bem feito), e aperta a mão dos vencedores, seja quem for.
Na verdade, não gosta muito de futebol. Talvez menos até que um pouco. Gosta, mesmo, é do povo vendo futebol.
Uma vez perguntamos, em seu gabinete, qual sua opinião sobre a cidade. A pergunta fora, se achava São Paulo “uma cidade humana”. Houve pequena demora, mas a resposta veio:
- “Não. Embora o seu povo seja benigno, acolhedor e hospitaleiro, como cidade grande, São Paulo se torna impessoal, avassaladora, egoísta, difícil e tentacular”.
Vendo o futebol, está junto do povo bom, hospitaleiro, “acolhedor”. Mas logo pegará um taxi (continua andando muito de taxi) e cairá na cidade grande, na cidade “desumana”. E então, começam os despachos loucos.
Quem o visse, logo depois, numa reunião política, dificilmente reconheceria o mesmo Jânio (do povo). Com os políticos, dá duro, xinga, chora. Se o contrariam, diz que “põe o chapéu na cabeça, vai embora, abandona tudo!”
Politicamente Jânio é um udenista no porre (definição de Afonso Arinos). Com tendências socializantes - como disse na Europa. Mas se acha muito próximo da democracia cristã. Fã de Lincoln. Gosta de Gandhi e Chaplin.
Agora, dizem, cuida de sua candidatura à presidência. Saiu-se bem no apoio a Juarez. Nenhuma falha, justiça lhe seja feita. No dia 11 de novembro, conduziu-se com altivez, sendo hoje, um dos únicos líderes civis com prestígio e autoridade junto à massa.
Em Presidente Prudente, outro dia, lançaram seu nome à presidência. Jânio pensou e soltou a frase de efeito:
- “Ainda mais essa, agora! Estou com um fardo às costas, querem me jogar outro!”
TRIBUNA DA IMPRENSA
25 de Janeiro de 1956.
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