quarta-feira, 22 de julho de 2015

WLADIMIR e MOURA, a pintura ingênua e primitiva do Nordeste

Paulo Wladimir, rio-grandense do norte de Currais Novos, da região de Seridó, radicado desde 1968 em S. Paulo, e Bal Moura, baiano de Feira de Santana, que vive na Capital há um ano, são os artistas nordestinos que expõe com sucesso nas galerias “Astréia’ e “Encontro”, nestes dias em que o centro artístico paulista está agitado, com duas mostras de grande porte, o Panorama da Arte Brasileira, e a XII Bienal, promovida pela Fundação Bienal, sob o comando, sempre, de Francisco Matarazzo Sobrinho. Paulo Wladimir, realista-mágico e ingênuo, já expôs em inúmeras individuais e coletivas, aqui e no exterior, onde goza de grande conceito da crítica especializada e colecionadores. Bal Moura, mais novo, firma-se agora, após andanças por Paraty, Florianópolis e Belo Horizonte. Wladimir vai logo respondendo sobre a faixa de pintura em que se situa. 
Adão e Eva - Paulo Wladimir

- Pinto sem me preocupar em me defender ou me situar em gênero algum, embora muito me comunique e tenha ligações com a escola ingênua. Alguns críticos e colecionadores já situaram meu trabalho dentro de um realismo mágico. O melhor é impor o trabalho por si, sem comprometê-lo com rótulos, pois, se depois sentir uma necessidade de guinada, pode-se ir ou voltar sem maiores explicações. 

- Julga-se um pintor de inspiração popular? E a antiga fase primitiva? 

- Na verdade, meu trabalho tem fundamento maior dentro da cultura popular, porém, também provém de outras fontes de inspiração. E a antiga fase dita primitiva, a própria pergunta já responde. Por enquanto, trata-se de uma antiga fase, apenas. 

- Como vê a arte brasileira atual? 

- Atualmente, a arte brasileira se encontra num momento muito agradável, tanto para o artista quanto para o consumidor. Trata-se do momento de auto-afirmação. É agradável para o artista porque está agora se tornando mais adulto. Desligando-se de uma influência direta vinda do exterior e descobrindo valores nossos, fazendo um outro tipo de ligação entre as duas correntes (a influência de fora com a elevação maior de elementos da nossa cultura), dando maior personalidade à apresentação e criando um trabalho mais brasileiro. E é agradável para o consumidor, porque ainda é tempo de acompanhar o surgimento de um novo mercado, com chance de descobrir valores novos empenhados em um sério trabalho. 

- Projetos atuais e futuros? 

- Projetos existem muitos. A realização mais próxima e importante é a participação na mostra em Bruxelas: Brasil Expo’73, onde fui incluído ao lado de grandes nomes da arte brasileira, que estarão representando nossos valores naquele evento. Imagens do Brasil que será a parte ligada à arte nesta grande feira, está sendo organizada brilhantemente pelo professor Pietro Maria Bardi, diretor do Museu Assis Chateaubriant, de São Paulo (MASP). Nesta mostra estará, também, parte da coleção particular minha e do pintor Crisaldo Morais, que foi solicitada pelo prof. Bardi. 

- Tem viajado ao Norte, pesquisou? 

- Antes desta minha exposição viajei durante 60 dias, de São Paulo até São Luiz do Maranhão, vendo e revendo elementos da cultura geral, o que em seguida desenvolvi para a mostra atual. O vernissage desta exposição foi para mim até surpreendente. Contei com a visita de inúmeras pessoas e uma venda de 60% da exposição naquela noite. 

- São Paulo comportaria um museu, ou centro de arte ingênua, ou popular, ou primitiva? Em que termos? 

- São Paulo comportaria, sem dúvida. Precisaria, porém, um trabalho muito sério, muito bem estruturado, sem sombra de improvisação, para que as pessoas levassem também a sério. Principalmente tendo o nome de museu. Teria também que ser um museu vivo, com elementos capazes de informar e provocar interesse, principalmente nas pessoas de sensibilidade e menos familiarizadas com a arte. Teria que ser um museu sem critério de seriedade, sem exagerar em preconceitos infundados. Palestras, filmes, exposições, intercâmbios, enfim uma abertura correspondente às expectativas do século XX. O ideal seria um museu sem conotações de moderno, folclórico, antigo, contemporâneo, primitivo, etc., e sem medo de concorrências na área. 

- Como se sente após tantos anos de luta, ao ver-se bem sucedido, com uma posição já firmada? Conselhos aos que se iniciam? 

Sinto-me cada vez mais empenhado num trabalho sério, correspondendo às expectativa daqueles que já confiaram em mim e principalmente naqueles que ainda não confiaram. Não teria conselho para ninguém, pois provavelmente minhas experiências de vida não funcionariam em outros indivíduos, pois cada pessoa é um mundo diferente e é nessa diferença que se pode criar um trabalho com personalidade própria, já que os elementos estão igualmente no ar. Nossa percepção e sensibilidade é que podem dar uma propriedade diferente. 

Bal Moura é também autodidata, conheceu Raimundo de Oliveira, seu conterrâneo, com a pintura do qual, a sua tem certa parecença. Fala duma enfiada só. 

- O meu trabalho é bastante minucioso e elaborado. Desde que comecei a pintar, há oito anos, sempre usei como tema a Bíblia e suas histórias fantásticas, transportando tudo isso para uma paisagem e clima bem brasileiro, tropical, usando elementos típicos do Nordeste como frutas, gentes, situações, etc. Morei em vários lugares - como Paraty, Florianópolis, Belo Horizonte, mas resolvi fixar-me agora em S. Paulo e estou aqui desde janeiro. Esta parada foi obrigatória por causa do nascimento de minha filhinha. Estou muito incentivado entre os paulistas e por colegas de primeira linha como Paulo Wladimir, por exemplo. 

 TRIBUNA DE SANTOS 7 de outubro de 1973.

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