terça-feira, 6 de janeiro de 2015

UM HOMEM QUE O BRASIL ESTÁ CONHECENDO - I

LUCAS GARCEZ, O MAIS VELHO DOS DEZ FILHOS DO ENGENHEIRO ISAAC, TEM APENAS 39 ANOS 

Nasceu no nº 122 da Rua Fagundes, em S. Paulo, onde ainda hoje vive modestamente sua mãe, dona Maria Dulce Nogueira Garcez - a infância às margens do Paraíba, a escola, o ginásio e a lição do pai, um técnico apaixonado pelas questões de hidráulica. 
O 122 da Rua Fagundes, em S. Paulo, é uma das muitas casas antigas do bairro da Liberdade. A ladeira, um pouco abaixo, perde-se no morro do Piolho. Há algumas dezenas de anos, a Liberdade era quase a periferia da cidade. S. Paulo derramou-se pelos morros e quintais e tornou a Liberdade um bairro central. Hoje, muitos dos seus prédios velhos vêm abaixo para dar lugar a arranha-céus. 


LUTA
As perguntas são sobre um filho seu, que há dois anos quase ninguém conhecia e que é o governador de São Paulo. Dona Maria Dulce reluta. Mas, compreendendo que isto nada tem de mal, começa a contar a história da família. 

10 FILHOS E UM DE CRIAÇÃO 
-“Eu e meu falecido Mario, o engenheiro Isaac Pereira Garcez, tivemos 10 filhos além de um de criação. O Lucas é o mais velho, acaba de completar 39 anos. A caçula é a Maria Helena Nogueira Garcez, que está no colégio e tem 16 anos. Os outros são Maria Dulce, assistente da cadeira de psicologia educacional da Faculdade de Filosofia, Maria Tereza, irmã carmelita, Marcos, juiz de direito, Mateus, padre, Maria Emiliana Garcez Ghirardi, Maria do Carmo, irmã carmelita, Isaac, oficial de gabinete do palácio, Maria Cecília Garcez Leme. E o filho de criação, hoje advogado, Sérgio Cirino da Silva 

O PAI 
- Meu marido, assim que se formou na Escola Politécnica, em dezembro de 1909, transferiu-se para Goiás, onde participou dos estudos para a construção da Estrada de Ferro Araguari - Catalão que depois se estendeu até a capital daquele Estado. Foi seu primeiro trabalho profissional depois de formado. Isaac era desde aí um apaixonado pelas questões de hidráulica, propensão que o filho Lucas herdaria. Depois que casamos, ele foi nomeado engenheiro da Era e, mais adiante, da Secretaria de Viação. Também tornou-se presidente do Conselho Regional de Engenharia, onde ficou até quase o fim de sua vida. No governo de Armando de Salles Oliveira, ocupou o cargo de diretor do Departamento das Municipalidades. Gostava de todos os ramos da engenharia, com exceção da eletricidade. Mais tarde trabalhou ainda Na Cia. Paulista de Estradas de Ferro, onde fez os estudos do ramal de Barra Bonita, e na Sorocabana, como engenheiro de linha. Morreu em agosto de 1946. 

NAVIO VELHO 
O Lucas, conta d. Maria Dulce, nasceu naquela mesma casa em dezembro de 1913. Ela morava em Queluz, onde o marido estava de serviço, mas veio para S. Paulo, porque desejava que o filho viesse à luz aqui. Ela sorri, olha em torno de si e diz: “esta casa que pertenceu à minha avó, foi tudo o que recebi de herança e agora a batizei de “navio velho” - “Meu marido era funcionário da Secretaria de Viação e duas funções o obrigavam a viajar muito. Assim, moramos vários anos em Queluz e Guaratinguetá, às margens do Paraíba, onde o Lucas viveu grande parte da meninice. A certa altura mudamos para a capital e lá ele fez seus dois primeiros anos primários, no ginásio S. Joaquim quando o transferimos para o ginásio S. Bento, em 1925. 

BOAS NOTAS 
O reitor do S. Bento, Dom Rafael Riepenhoff mostrou-nos um livro onde se lê que o menino Lucas Nogueira Garcez, entre 99 outros alunos, distinguira-se no 3º ano primário, com outros oito colegas, em comportamento e aplicação. MUDANÇAS Prossegue a senhora Maria Dulce: - Tivemos, nessa ocasião, necessidade de mudar novamente e desta vez para São Carlos. Lá ele completou o primário e cursou o ginásio Diocesano (1926-a929). Depois transferímo-lo para o ginásio Estadual (hoje Presidente Roosevelt) quando mais uma vez, voltamos a S. Paulo. 

NOS BONDES 
Seu colega de ginásio de São Carlos, o sr. Murilo Matos Faria, hoje juiz em S. Paulo, conta que se acostumara a gostar “daquela família modesta, cada vez mais numerosa, e cujo pai, o engenheiro Isaac, “devia lutar muito para sustentá-la”. - O Lucas - diz ele - era como ainda é hoje: espírito vivo, obstinado nas coisas que deseja, esclarecido, sincero a toda prova, um pouco fechado, mas sempre uma lhaneza de trato única. Enquanto fui seu colega (1926-27) lá em S. Carlos, ele sempre foi o primeiro da classe, o mais estudioso. Lembro-me que ele era um bom latinista e já naquele tempo se preocupava com estudar o alemão, uma vez que tinha intenções, desde aquele tempo, de mais tarde seguir a carreira de engenharia, para a qual precisaria dessa língua. Chegou a ter professora particular e, muitas vezes, quando íamos para a escola, ele ia-me contando as palavras que aprendera na última aula. Não posso negar que também acabei aprendendo um pouco... De resto, posso dizer que o Lucas acompanhava sempre a turma quando surgia qualquer movimento grevista. Nunca furou parece... Colaborava nos jornais acadêmicos e... sempre resolveu tudo diplomaticamente, sem xingar ninguém... Mas, por certo, ninguém podia imaginar o que lhe viria depois. 

REDATOR 
O diretor do ginásio diocesano de S. Carlos, no interior paulista, professor José de Brito Castro, conta: - Durante os três anos em que foi aluno do ginásio Diocesano, o estudante Lucas Garcez praticou esportes, era assíduo às aulas de educação física (então facultativas) e prestou excelente concurso ao Grêmio Literário “Coelho Neto”, então órgão da associação dos alunos, principalmente como redator do jornal estudantil “A Voz Ginasial”. Em todas as suas atividades, quer escolares, quer extra-escolares, esse estudante foi sempre um exemplo de aluno bem comportado, estudioso e cumpridor dos seus deveres, sendo até hoje lembrado carinhosamente pelos seus mestres e colegas. 

COLEGAS DE GINÁSIO 
Ainda de sua passagem pelo ginásio de S. Carlos, diz o seu diretor que ele obtinha ótimas notas “principalmente em línguas e história universal”. Foram seus colegas de turma Armando Amaral (médico no Rio), Marcelo Ataíde (juiz de direito em Goiás), Luiz Saya (engenheiro em S. Paulo), Dario Bartolomé (médico no Rio), Clovis V. Oliveira (advogado e inspetor federal em São Paulo), Augusto Agnelli (do comércio de S. Carlos) Miguel Hernandez ((médico em Ariranha) e vários outros. 

TRIBUNA DA IMPRENSA 
Rio de Janeiro, 6 de janeiro de 1956 - terça-feira.

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